
O Planejamento Tributário pode ser entendido como a soma de todos os estudos que se propõem a examinar meios de reduzir a carga tributária, ou ainda, alcançar uma justa carga tributária. A partir da análise de determinada legislação ou operação, procuram-se medidas e procedimentos tendentes a reduzir, evitar ou postergar a incidência ou o pagamento de tributos. A redução ou o não pagamento de tributos podem representar uma atividade lícita de gestão de custos, ou uma atividade ilícita de simulação e fraude. Diferenciam-se, assim, dois conceitos: a elisão e a evasão.
Por elisão se entende as atividades dos contribuintes de estruturação de suas operações da maneira mais eficaz e eficiente sob a perspectiva tributária, desde que dentro dos limites da lei. É o uso de procedimentos legais com a finalidade de evitar a ocorrência do fato gerador de tributos, ou ainda, de ocasionar hipóteses de incidência menos onerosas. Em contrapartida, a evasão fiscal consiste na ocultação da hipótese de incidência da exação tributária, mediante fraude ou simulação.
Como se pode inferir dos conceitos de elisão e evasão, o critério adotado para distinção das práticas lícitas das ilícitas é o tempo. Se as medidas adotadas ocorrerem antes do fato imponível, levadas a efeito com a finalidade de evitá-lo, tratar-se-á de elisão fiscal. Lícito, portanto. Por outro lado, caso sejam empregadas medidas após a ocorrência do fato imponível, com a finalidade de ocultá-lo, se estará diante de simulação ou fraude, o que caracteriza a evasão fiscal. Neste último caso o planejamento tributário será ilícito.
Após a alteração do Código Tributário Nacional, com o advento da Lei Complementar 104/2001, passou-se a adotar em nosso Ordenamento Jurídico critério diverso para identificação da licitude dos planejamentos. A Lei Complementar 104, de 10 de janeiro de 2001, acrescentou à redação do art. 116, do Código Tributário Nacional, parágrafo único, que autoriza a autoridade administrativa a “desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária”.
O referido dispositivo foi inicialmente regulamentado pela Medida Provisória n.º 66/02, que dispunha em seu art. 14 serem passíveis de desconsideração todos os atos ou negócios jurídicos praticados com o objetivo de reduzir, evitar ou postergar o pagamento de tributos. A redação é clara e, por simples subsunção de premissas, nos é possível evidenciar que o conceito clássico de Planejamento Tributário foi posto em xeque pela legislação.
Em outras palavras, o artigo da MP dispunha que todo o Planejamento Tributário seria passível de desconsideração, estando a caracterização de licitude das operações atrelada a critério diverso do tempo. Para que fosse possível à autoridade tributária desconsiderar atos ou negócios jurídicos, na forma da MP 66/02, era necessário evidenciar a ausência de propósito negocial ou abuso de forma. Ou seja, ainda que as medidas adotadas em razão de Planejamento Tributário ocorram antes do fato imponível, com a finalidade de evitá-lo, uma vez ausente o propósito negocial, as operações serão desconsideradas e o planejamento será taxado por ilícito. Esta nova dimensão de avaliação dos planejamentos tributários denomina-se elusão fiscal.
A Medida Provisória n.º 66/2002 foi convertida em lei (Lei n.º 10.637/2002), e quando da sua conversão, a redação do artigo 14 não foi mantida, o que significa dizer que a norma insculpida no artigo 116, parágrafo único do CTN, atualmente, carece de regulamentação por lei ordinária. Não obstante, os novos critérios para definição do espectro de licitude dos Planejamentos Tributários, a saber, o propósito negocial e o abuso de forma, foram internalizados e podem ser verificados na praxis da Receita Federal, do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF e da jurisprudência dos Tribunais.
De modo geral, com a alteração do CTN e, principalmente, com a internalização em nosso Sistema Jurídico da doutrina do business purpose, o planejamento da tributação, no que toca à avaliação da sua licitude, sofreu drásticas mudanças, passando a ser compreendido como planejamento lícito aquele conjunto de medidas que, atentas ao propósito negocial do contribuinte e levadas a efeito antes da ocorrência do fato imponível, acabam por gerar a redução, evitando ou postergando o pagamento de tributos. A diferença reside no protagonista do Planejamento, que não mais é a redução das exações tributárias propriamente, mas sim a eficiência da atividade empresarial ou do negócio jurídico celebrado.
A legislação brasileira não definiu o que é propósito negocial. Da análise das decisões administrativas do CARF, identifica-se três as propriedades comumente analisadas para determinar a existência do business purpose*:
Houve um adequado intervalo entre as operações?
É comum o entendimento pela não existência de outros motivos na operação além da economia tributária, por terem as operações ocorrido dentro de um intervalo de tempo inadequado. Cita-se, por exemplo, operações societárias que normalmente demoram meses para ocorrer e que em alguns casos foram realizadas em intervalo de horas ou dias.
As partes envolvidas eram independentes?
Outra propriedade importante para definir a existência de propósito negocial é a autonomia e independência das pessoas envolvidas, sejam elas pessoas naturais ou pessoas jurídicas. Muitos negócios jurídicos foram descaracterizados por terem sido realizados entre empresas de mesmo grupo ou familiares.
Existe coerência entre a operação e as atividades empresariais das partes envolvidas?
Para a constatação da existência de propósito negocial, entende a Administração que o planejamento tributário deve estar intimamente relacionado com a atividade operacional das partes.
Como se vê, ainda que falte à regra do art. 116, parágrafo único, do CTN regulamentação por lei ordinária, a Administração Tributária e os Tribunais pátrios já se inclinam a adotar a nova sistemática de determinação da licitude dos negócios jurídicos praticados.
Diante deste cenário, as Empresas Familiares e as Famílias Empresárias, quando do planejamento de suas operações relacionadas às suas atividades econômicas, às alocações patrimoniais e a aspectos sucessórios, devem orientar-se pelas propriedades e critérios de que tratamos acima, a fim de obter a maior eficiência dos custos tributários, com segurança e diligência.
Referência:
* SCHOUERI, Luis Eduardo. Planejamento Tributário e o “Propósito Negocial”. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2010, pgs. 30-32.
Luciano Comunello
luciano@advocaciacr.com.br
Advogado formado pela PUCRS, com LLM em Direito dos Negócios pela Unisinos e especialização em Gestão de Tributos e Planejamento Tributário Estratégico pela Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da PUCRS.
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