A herança e as quotas sociais
- Comunello & Rohden
- 29 de jul. de 2020
- 3 min de leitura

O ramo do Direito que se dedica à transmissão do patrimônio de uma
pessoa como consequência de seu falecimento denomina-se Direito das
Sucessões. O falecido (ou de cujus) poderá deixar bens aos seus sucessores,
seja por previsão legal, que estabelece quem são os herdeiros legítimos, bem
como por força de testamento, através do qual, como regra geral e sem nos
aprofundarmos na questão, poderá destinar até 50% do seu patrimônio
disponível a quem seja de sua vontade, respeitados eventuais impedimentos
legais.
Pode ocorrer que, com a partilha, os herdeiros tenham a receber quotas
de sociedade empresária. O tipo empresarial e eventuais disposições
societárias terão interferência direta na questão da sucessão causa mortis em
relação a eventuais participações societárias. Nesse caso serão aplicadas
regras tanto do Direito Sucessório, quanto do Direito Societário, esse último
visando a preservação da empresa. Abordaremos aqui a sucessão causa
mortis envolvendo quotas de empresa do tipo limitada, com mais de um sócio.
A sucessão deve ser bem planejada, de modo que o falecimento de um
dos sócios não seja um risco à continuidade da atividade empresarial. Mais
uma vez destacamos, portanto, a importância do contrato social, que,
preferencialmente deverá prever o modo a se proceder com a morte de um dos
sócios. Importa saber que a questão relativa à herança de quotas societárias
ultrapassa os limites do inventário e as normas de Direito Sucessório.
O art. 1.028 do Código Civil, no caso de falecimento de um dos sócios,
dispõe que as quotas devem ser liquidadas, salvo se o contrato social dispuser
de modo diferente, se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da
sociedade ou, se por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do
sócio falecido.
Assim, se o contrato social não dispuser sobre os procedimentos a
adotar com o falecimento do sócio, aplica-se o quanto previsto no Código Civil.
Outra possibilidade é que do contrato social conste, ao menos, a previsão de
como será feita apuração do valor das quotas, o que facilitará a liquidação.
Omisso também em relação a tal ponto, o artigo 1.031 do Código Civil prevê a
liquidação da quota com base na situação patrimonial da sociedade, à data da
resolução, verificada em balanço especialmente levantado, com a proporcional
redução do capital social, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota.
Não havendo previsão no contrato social, a quota social liquidada será paga
em 90 dias a contar da liquidação, em dinheiro.
Diante da omissão no contrato social, os herdeiros poderão também
requerer judicialmente, com a realização de perícia com tal finalidade, a
avaliação do patrimônio da empresa, prolongando os trâmites do inventário e,
podendo haver consequências no andamento da atividade empresarial.
Importante ressaltar, ainda, dois temas que, invariavelmente, suscitam
dúvidas quando a sucessão envolve quotas sociais:
a) a responsabilidade dos herdeiros sobre dívidas da empresa;
b) a possibilidade de os herdeiros receberem, em pagamento às quotas
liquidadas, bem específico que anteriormente pertencia ao falecido e
foi aportado na empresa.
Quanto à responsabilização dos herdeiros pelas dívidas da sociedade,
dispõe o artigo 1.032 do Código Civil, que os mesmos não se eximem das
obrigações da empresa anteriores ao falecimento do sócio, até dois anos após
averbada a resolução da sociedade. Porém, nesses casos aplica-se regra de
Direito das Sucessões, contida no artigo 1.792 do Código Civil, que limita essa
responsabilização ao patrimônio herdado. Ou seja, se por força da participação
societária do falecido o herdeiro precisar responder pelas dívidas existentes,
somente responderá até a quantia representada por eventual patrimônio que
tenha recebido do de cujus, jamais com seu patrimônio proveniente de outras
fontes. Sinale-se que isso não quer dizer que um imóvel que comprou, por
exemplo, com recursos próprios, antes do falecimento daquele a quem
sucedeu, não possa ser penhorado por dívidas societárias caso já tenha se
desfeito do patrimônio que recebeu em herança. Não há uma vinculação direta
aos bens herdados, mas à sua expressão patrimonial.
Relativamente ao item “b”, tendo os herdeiros créditos a receber da
sociedade, não poderão exigir que determinado bem empregado pelo falecido
na integralização de quotas societárias seja utilizado para esse pagamento,
ainda que de conhecimento que fosse intenção do de cujus seu retorno futuro
ao patrimônio familiar, haja vista que o bem passou a pertencer à pessoa
jurídica.
Conclui-se, portanto que, mais uma vez, fica evidenciada a importância
do contrato social construído com base no planejamento de questões vitais na
preservação da atividade empresarial, dentre elas a questão sucessória,
cabendo destacar também, diante a possibilidade de previsão do ingresso dos
herdeiros na sociedade, a importância de preparação do sucessor para
assunção das novas responsabilidades. A dinâmica empresarial é sempre
muito mais ágil que a dinâmica dos inventários, sendo o planejamento o melhor
instrumento para se evitar conflitos e dificuldades financeiras futuras.
Débora Rohden
debora@advocaciacr.com.br
Advogada formada pela PUCRS, com pós-graduação em Processo Civil pela mesma Universidade e cursos de extensão em temas relacionados ao Direito de Família e Direito Bancário.
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